30 junho 2013

CURTAS LETRAGENS [...também nossos filhos, outros filhos...]



como se diz AMO-TE:

- com o coração, num sopro quente
- de olhos nos olhos das feridas que não sabemos sarar
- com sorrisos a escorrer ternura do olhar
- num colo, num abraço, num gesto puro


da Plátano Editora
num carinhoso entrelaçar de mãos de vários jornalistas


VALE A PENA AJUDAR
Associação As Florinhas da Rua


http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/1218799127Z7uLZ4su1Vg14KQ1.pdf

 A assistência social e familiar do Estado Novo nos anos 30 e 40**

 De: Irene Flunser Pimentel*





os autores deste livro, todos ligados à comunicação social, sensíveis à exclusão e ao sofrimento de imensas crianças, decidiram dar este pequeno contributo, esperançados em atenuar esse mundo doloroso e cheio de perguntas impossíveis de responder, porque não se explica a um inocente, a um abandonado, seja ele orfão, deficiente ou na plenitude das suas capacidades, o inexplicável.

forçados a conviver de perto com esta cruel realidade, com esta forma de guerra desumana, e quantas vezes escondida, que exige combater com carácter urgente, lançámo-nos pedagógicamente a este projecto. essas meninas e esses meninos indefesos, merecem que todos nós lhes proporcionemos coisas simples, como peças de roupa e brinquedos, e que as peguemos ao colo como se fossem nossos filhos.

obtida a adesão da Plátano Editora, faltava-nos encontrar uma instituição a quem doar os nossos direitos de autor. pairava no espírito de todos a ideia de o fazer junto de quem não usufruísse de apoios oficiais - apesar de sempre escassos -, tenham eles o rosto que tenham. feitas as pesquisas, por votação, a maioria fez recaír a opção numa organização que se dedica à recolha e apoio a crianças orfãs e de risco.

Florinhas da Rua!

de: Os Autores







  

26 junho 2013

NÃO ENTENDO

 
SORRI porque:
ESTÁS A SER FILMADO!!!...
 
 

TOKAGE
Fabien Delaube
[imagem da net]


Não entendo.
Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender.
Entender é sempre limitado.
Mas não entender pode não ter fronteiras.
Sinto que sou muito mais completa quando não entendo.
Não entender, do modo como falo, é um dom.
Não entender, mas não como um simples de espírito.
O bom é ser inteligente e não entender.
É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida.
É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice.
Só que de vez em quando vem a inquietação:
quero entender um pouco.
Não demais:
mas pelo menos entender que não entendo.

Clarice Lispector
[Á Descoberta do Mundo]


 
 
 
 
 

24 junho 2013

O BEIJO DE GUSTAV KLIMT

 
 
 


O BEIJO É SÓ UMA PALAVRA
ESCOLHIDA
AO ACASO. O QUE AS TINTAS
ENCOBREM E DESCOBREM
E OS PINCEIS REVELAM,
MAS NÃO NOMEIAM,
É A ORDEM
QUE SE PRESSENTE EM TODAS
AS NEBULOSAS. QUE SEMPRE
A ORDEM PRECEDE
A DESORDEM. E ESSA
É UMA DAS LEIS
INDECLINÁVEIS
DO AMOR. A SUA REGRA
DE OURO, QUE NÃO ADMITE
EXCEPÇÕES.


Albano Martins
 
 
 
 
 

22 junho 2013

ARTE POÉTICA

 


"o poema não tem mais que o som do seu sentido,
a letra p não é a primeira letra da palavra poema,
o poema é esculpido de sentidos e essa é a sua forma,
poema não se lê poema, lê-se pão ou flor, lê-se erva
fresca e os teus lábios, lê-se sorriso estendido em mil
árvores ou céu de punhais, ameaça, lê-se medo e procura
de cegos, lê-se mão de criança ou tu, mãe, que dormes
e me fizeste nascer de ti para ser palavras que não
se escrevem, Lê-se país e mar e céu esquecido e
memória, lê-se silêncio, sim tantas vezes, poema lê-se silêncio,
lugar que não se diz e que significa, silêncio do teu
olhar doce de menina, silêncio ao domingo entre as conversas,
silêncio depois de um beijo ou de uma flor desmedida, silêncio
de ti, pai, que morreste em tudo para só existires nesse poema
calado, quem o pode negar?,que escreves sempre e sempre, em
segredo, dentro de mim e dentro de todos os que te sofrem.
o poema não é esta caneta de tinta preta, não é esta voz,
a letra p não é a primeira letra da palavra poema,
o poema é quando eu podia dormir à tarde nas férias
do verão e o sol entrava pela janela, o poema é onde eu
fui feliz e onde eu morri tanto, o poema é quando eu não
conhecia a palavra poema, quando eu não conhecia a
letra p e comia torradas feitas no lume da cozinha do
quintal, o poema é aqui, quando levanto o olhar do papel
e deixo as minhas mãos tocarem-te, quando sei, sem rimas
e sem metáforas, que te amo, o poema será quando as crianças
e os pássaros se rebelarem e, até lá, irá sendo sempre tudo.
o poema sabe, o poema conhece-se e, a si próprio, nunca se chama
poema, a si próprio, nunca se escreve com p, o poema dentro de
si é perfume e é fumo, é um menino que corre num pomar para
abraçar o seu pai, é a exaustão e a liberdade sentida, é tudo
o que quero aprender se o que quero aprender é tudo,
é o teu olhar e o que imagino dele, é solidão e arrependimento,
não são bibliotecas a arder de versos contados porque isso são
bibliotecas a arder de versos contados e não é o poema, não é a
raiz de uma palavra que julgamos conhecer porque só podemos
conhecer o que possuímos e não possuímos nada, não é um
torrão de terra a cantar hinos e a estender muralhas entre
os versos e o mundo, o poema não é a palavra poema
porque a palavra poema é um palavra, o poema é a
carne salgada por dentro, é um olhar perdido na noite sobre
os telhados na hora em que todos dormem, é a última
lembrança de um afogado, é um pesadelo, uma angústia, esperança.
o poema não tem estrofes, tem corpo, o poema não tem versos,
tem sangue, o poema não se escreve com letras, escreve-se
com grãos de areia e beijos, pétalas e momentos, gritos e
incertezas, a letra p não é a primeira letra da palavra poema,
a palavra poema existe para não ser escrita como eu existo
para não ser escrito, para não ser entendido, nem sequer por
mim próprio, ainda que o meu sentido esteja em todos os lugares
onde sou, o poema sou eu, as minhas mãos nos teus cabelos,
o poema é o meu rosto, que não vejo, e que existe porque me
olhas, o poema é o teu rosto, eu, eu não sei escrever a
palavra poema, eu, eu só sei escrever o seu sentido. "

José Luís Peixoto
"Criança em Ruínas"

 

 

13 junho 2013

NÃO ACREDITES...



[...]

não acredites neste breve sono;
 não dês valor maior ao meu silêncio;
 e se leres recados numa folha branca,
 não creias também: é preciso encostar
 teus lábios em meus lábios para ouvir.
nem acredites se pensas que te falo:
 palavras
 são o meu jeito mais secreto de calar.

Lya Luft



06 junho 2013

CAL

 
 
  
... ana molhou uma toalha no alguidar e envolveu a mão do fugitivo
onde faltava o dedo médio e o indicador... na sua pele o sangue era mais claro
do que na toalha. na toalha, tinha a côr de um grito de sangue. na pele, era
como se fosse a memória do sangue.
 
... os olhos de ana não tinham idade e, quando reparou que os olhos daquele
homem também não tinham idade, o sangue parou de embeber a toalha.
 

quando chegou março,
nasceram flores nos campos.
debaixo da azinheira nasceu
uma única flor.
                 era uma flor bravia
as raízes dessa flor
atravessavam a terra, eram
longas, e entravam dentro do
corpo do mudo. aquilo que
tinha sido a vida do mudo
entrava por essas raízes
e corria dentro dessa flor.
ninguém sabia, mas o mudo
era essa flor. continuava
mudo. as suas roupas pretas,
apodrecidas debaixo da terra,
eram pétalas brancas. os fios
da sua barba, misturados com
a terra, eram pétalas brancas.
a cadela, sem saber que ele
era uma flor, continuava
perdida pelas ruas da vila.

José Luís Peixoto


 
 

01 junho 2013

ESTRADA DE FOGO




 
pedra a pedra a estrada antiga
sobe a colina, passa diante
de musgosos muros e desce
para nenhum sopé;

encurva, na abstracta encruzilhada;
apaga-se, na realidade. morre
como o rastilho de fogo,
que de campo em campo aberto

seguia, e ao bater na mágica cancela
dobrava a chama, para uma respiração,
e deixava o caminho do portal
incólume e iniciado.
 
Fiama Hasse Pais Brandão